FUI PARA FORA CÁ DENTRO...
Fotografia de Daniel Blaufuks
Informo os estimados clientes que este café estará encerado durante os próximos dias, finalmente as tão aguardadas e bem merecidas férias, como tal as bicas que aqui forem tomadas estarão frias.
Prometo voltar em breve...
O BAIRRO
Depois de nos ter presenteado no final do ano passado com mais dois moradores no BAIRRO, o senhor KRAUS e o senhor CALVINO, do qual já faziam parte os senhores BRECHT, VALÉRY, HENRI e JUARROZ, chega-nos agora mais um novo morador, o senhor WALSER... mas atenção, este novo vizinho do bairro, não mora exactamente no bairro, embora faça parte dele como todos os outros, mora ali, um pouco mais ao lado, mais propriamente no meio do campo, isolado, como sempre quis, na sua nova casa, acabada de construir, (talvez porque o senhor Robert Walser* assim o era, um ser isolado e muito solitário). É notável a construção de personagens que Gonçalo M. Tavares tem vindo a construir para dar vida a um bairro imaginário que se tivesse realmente existido seria sem duvida um lugar mágico e um local muito agradável de se viver. Mas Gonçalo M. Tavares não se fica por aqui, apresentando-nos na contra-capa deste seu novo livro um novo mapa onde se anunciam já os próximos moradores deste BAIRRO, os senhores RIMBAUD, BALZAC,CARROLL, MELVILLE, PROUST, HENRI M., CORTÁZAR, GOGOL, MUSIL, FOUCAULT, WITTGENSTEIN, BECKETT, ORWELL, BORGES, PESSOA, ELIOT, PIRANDELLO, BURROUGHS, WELLS, VOLTAIRE, WARHOL, DUCHAMP, CORBUSIER, LOYD WRIGHT, JOYCE, KAFKA, BRETON, MISHIMA, LORCA, C. ANDERSON, SWENDENBORG, e as Senhoras WOOLF e BAUSCH. Enfim, um mundo ainda por descobrir na arte suprema de Gonçalo M. Tavares.
Gonçalo M. Tavares "O senhor Walser" caminho
desenhos de Rachel Caiano
*ROBERT WALSER
Escritor suíço de língua alemã nascido em 1878 (Biel), escreveu vários romances, dos quais quatro fazem parte do catálogo da editora relógio d'água, O Ajudante, A Rosa, O Salteador e Jacob von Guten um diário (adaptado para o cinema em 1995 por Stephen e Timothy Quay "Instituto Benjamenta"), escreveu também muitos contos um dos quais também adaptado pelo realizador português João César Monteiro em 2000, o tão polémico "Branca de neve". Morreu a 25 de Dezembro de 1956, quando dava um dos seus passeios solitários, perto do manicómio de Herisau, local onde passou os seus últimos anos.
Edward Hopper [ South Truro Church ] 1930
AMOU TANTO
Agora era velhinha e não conseguia sentir-se tomada de qualquer sentimento em relação a coisa alguma, mas tinha amado muito.
Esperava ainda encontrar-se com algum ser que se movesse sobre a crosta da terra.
Até que se enamorou pela fachada de uma igreja de Assis, decidindo mudar-se para aquela cidade. Era Inverno, e durante os temporais nocturnos, saía com um guarda-chuva para fazer companhia à igreja, plena de uma luz amedrontada.
Depois, chegou a Primavera, e todas as manhãs e todas as tardes, com as mãos, tocava as pedras quentes e enxutas. Foi um amor sereno e sem traições que durou até à sua morte.
Tonino Guerra
Peter Blake [ I Love You ]
Transformar o amor para melhorar o amor
Transformar o corpo para melhorar o corpo.
Transformar a poesia para melhorar a poesia
Transformar este sítio para melhorar este sítio
mas transformar também este sitio para melhorar aquele sítio.
Transformar o corpo para melhorar outros corpos.
Transformar o amor para melhorar o amor
Gonçalo M. Tavares
PREFÁCIO
Antes do sol se pôr, o céu do Estoril enche-se de malvadas andorinhas. E isto estraga os planos de qualquer pessoa. Não há ordem naquela zaragata tão bem voada, que segue uma indecisão rabugenta e faz questão de confundir o que tanto custou a juntar.
As minhas andorinhas, tal qual as ruas, adivinham a minha morte, fingindo a vida. O sono é uma tarde perdida, para a qual não se acordou, às quatro da tarde, ou lá o que é: o mais que se sonhou é pouco para se ver.
O meu amor tem duas coisas pouco claras.
E esta é uma delas: pôr-me a olhar para o que não posso saber.
É na distracção que está a felicidade e estas crónicas pretendem desviá-la mais ainda. Cada andorinha tem a sua pancada— elas próprias talvez preferem «missão» —, mas não se consegue atribuí-las por mais de um segundo a uma única que seja, porque trocam de pancada em pleno voo e não têm peso.
Ia morrendo.
As andorinhas sabem que são bonitas e que o céu, sem elas, se ressente. Gostam de fazer sofrer quem as vê no intuito de pensar nalguma coisa. E sabem sempre que não há confusão ou algazarra que possa compensar a alegria que parecem trazer mas podem não trazer só por serem andorinhas.
Nunca é bom sinal começar a reparar nos passarinhos. Mas as andorinhas são um caso especial. Há ali uma identidade trocada qualquer; a tinta-da-china, que pareceu gatafunho a quem tinha tempo para perder com complicações de uma só cor: preto, branco e azul. E cada preto, cada branco e cada azul, claro ou escuro ou cinzento, conforme a andorinha no momento em que a vê — e quando se diz, sempre muito antes de se ver. Faz o quê ? Voa.
Voa apesar de tudo. E, apesar de tudo, voa.
Miguel Esteves Cardoso in. " A minha andorinha " assírio & alvim
Não sei se isto é amor. Procuro o teu olhar,
Se alguma dor me fere, em busca de um abrigo;
E apesar disso, crê! nunca pensei num lar
Onde fosses feliz, e eu feliz contigo.
Por ti nunca chorei nenhum ideal desfeito.
E nunca te escrevi nenhuns versos românticos.
Nem depois de acordar te procurei no leito
Como a esposa sensual do Cântico dos Cânticos.
Se é amar-te não sei. Não sei se te idealizo
A tua cor sadia, o teu sorriso terno...
Mas sinto-me sorrir de ver esse sorriso
Que me penetra bem, como este sol de Inverno.
Passo contigo a tarde e sempre sem receio
Da luz crepuscular, que enerva, que provoca.
Eu não demoro o olhar na curva do teu seio
Nem me lembrei jamais de te beijar na boca.
Eu não sei se é amor. Será talvez começo...
Eu não sei que mudança a minha alma pressente...
Amor não sei se o é, mas sei que te estremeço,
Que adoecia talvez de te saber doente.
Camilo Pessanha
CÂNTICO NEGRO
"Vem por aqui" - dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidade!
Não acompanhar ninguém.
- Que eu vivo com o mesmo sem-vontade
Com que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí! Só vou por onde
Me levam meus próprios passos...
Se ao que busco saber nenhum de vós responde
Por que me repetis: "vem por aqui!"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,
Redemoinhar aos ventos,
Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo, foi
Só para desflorar florestas virgens,
E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!
O mais que faço não vale nada.
Como, pois sereis vós
Que me dareis impulsos, ferramentas e coragem
Para eu derrubar os meus obstáculos?...
Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós,
E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos, as torrentes, os desertos...
Ide! Tendes estradas,
Tendes jardins, tendes canteiros,
Tendes pátria, tendes tectos,
E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a, como um facho, a arder na noite escura,
E sinto espuma, e sangue, e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que guiam, mais ninguém.
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe;
Mas eu, que nunca principio nem acabo,
Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou
- Sei que não vou por aí!
José Régio in. "O Cântico Negro" edições Quasi
Fotografia de Ralph Gibson
A BOCA DA VERDADE
O poeta LAWRENCE FERLINGHETTI, não cessa de pôr a poesia ao serviço da vivência andarilha, como numa permanente viagem pela vida sem fim, e suas paisagens mentais em multicolor. Tomando as palavras ao vivo e submetendo-as à mutação do instante, à autenticidade da emoção. Como um visionário percorrendo todos os cantos do teatro quotidiano, surpreendendo com lanterna mágica as várias faces do enigma poético, e usando para isso "a bela língua" ritmada de sons coloridos. Aventura onde as palavras são o veículo de situações específicas. Tocando o essencial de cada coisa de cada ser.
Atento a tudo, Lawrence Ferlinghetti, deixou de ser um poeta inspirado e passou a ser um inspirador.
O seu mundo é um longo percurso inconformista feito na estrada, no Jazz e na rua , Poeta da irreverência de São Francisco, implicado contra a guerra do Vietnam e todas as guerras (de Super Tiranus) censuras e polícias do espírito.
Poeta pacífico, exuberante e activo, permanece um percursor da nova poesia revolucionária, assim como Jack Kerouac, Allen Ginsberg, entre outros.
Ferlinghetti resiste à engrenagem da América decadente, mantém-se o Homem da estrada.
A poesia Beat é um meio de libertação total do espirito, voltada para o futuro, voltada para os que se procuram em oposição a tudo o que está acabado, fixo, estático, estabelecido.
Neste horizonte onde Lawrence Ferlinghetti continua vigilante, mostra-nos a cor da liberdade, o odor da revolta, a multiplicação de outros possíveis, onde o homem, a vida, a poesia, não são outra coisa senão uma invenção colectiva em perpétua mutação, em perpétua busca do sentido convulsivo.
Lawrence Ferlinghetti é a prolongação de Rimbaud, Artaud e todos os que souberam arriscar-se para arrancar a máscara à REALIDADE.
" SOU UMA LÁGRIMA DO SOL, SOU O HOMEM DOS POEMAS DESPENTEADOS, SOU UMA COLINA DE POESIA "
Lawrence Ferlinghetti
SAUDAÇÃO
A todo o animal que devora seus semelhantes
ou os mata a tiro
A cada caçador armado numa camioneta
de atrelado
E cada recruta atirador d'elite ou milícia
com mira telescópica
E cada campesino com botas cães e espingarda
de cano cortado
E cada guarda com cães ensinados a perseguir
a matar
E cada chui à paisana ou agente secreto
com cinturão carregado
de morte
E cada servo do povo disparando sobre a
multidão
ou metralhando criminais em fuga
E cada guarda civil em qualquer país
guardando civis com algemas & carabinas
E cada carabineiro de qualquer Check Point Charley
de qualquer lado de qual
muro de Berlin cortina de Bambu
ou de Tortilha
E cada tropa polícia de trânsito com farda
de cavaleiro por medida
& capacete de plástico & gravata de laço
& pistola de seis tiros num estojo
com cravos de prata
E cada nívea com revolver anti-tumulto
& alarmes e cada tanque
anti-tumulto
gás tóxico & gás lacrimogéneo
E cada piloto d'elite com bombas e napalm
debaixo das asas
E cada piloto de céu abençoando os bombardeiros
na descolagem
E cada Departamento do Estado de qualquer
super estado
vendendo armas aos dois campos
E cada nacionalista de qualquer nação
de qualquer mundo Negro Mestiço
ou branco que mata pela nação
E cada profeta ou poeta com arma de fogo
ou navalha impondo pela força
a iluminação espiritual
ou impondo pela força o poder
de qualquer estado poderoso
E a todos que matam e matam e matam
& matam pela Paz
ergo o dedo do meio
no única saudação que merecem.
Lawrence Ferlinghetti in. " A Boca da Verdade "
A IDENTIDADE DOS CONTRÁRIOS
Sonho que sou louco, e na minha loucura
Sou mais sensato que num sonho
Ou acordado, com medo que me tenham por louco
Meus companheiros de sonho.
Meu bom senso é diária loucura,
Para um mundo em vigília que atribui
Mais vigília e atenção mais funda
À razão do que a razão possui.
Sonho é minha vida diária, cada dia
Simula e dissimula até loucura
E razão serem ambas semelhantes,
E eu ajo enquanto sonho.
No sonho, o bom senso e a loucura,
Na loucura, o sonho e o dia a dia
Ligados, entre si todos semelhantes:
Sonhando ou acordado, sou louco e sou sensato.
Edouard Roditi
in. "As Magias" versões de Herberto Helder, Hiena editora, 1987
RECEITA SURREALISTA
Mande vir com que escrever, depois de se ter instalado num lugar tão próprio quanto possível à concentração do seu espírito sobre si-mesmo. Coloque-se no estado mais passivo, ou receptivo, que poder. Abstraia do seu génio, do seu talento e de todos os outros. Repita a si-próprio que a literatura é um dos mais tristes caminhos que levam a tudo. Escreva depressa sem assunto prévio, suficientemente depressa para não parar e não ser tentado a rever. A primeira frase virá sozinha, de tal modo é verdade que em cada segundo existe uma frase estranha no nosso pensamento que só deseja exteriorizar-se. É bastante difícil pronunciarmo-nos sobre o caso da frase seguinte; ela participa simultaneamente da nossa actividade inconsciente e da outra, se admitirmos que o facto de termos escrito a primeira arrasta um mínimo de percepção. Aliás, isso pouco lhe deve importar; é nisso que reside, na maior parte dos casos o interesse do jogo surrealista.
A verdade é que a pontuação se opõe, sem dúvida à continuidade absoluta da corrente de que estamos a falar, embora pareça tão necessária como a distribuição dos nós numa corda vibrante. Continue enquanto lhe apetecer. Fie-se no carácter inesgotável do murmúrio (...).
André Breton
fotografia de Man Ray
RECEITA DADAISTA
Pegue num jornal.
Pegue numa tesoura.
Escolha no jornal um artigo que tenha tamanho que pensa dar ao seu poema
Recorte o artigo.
Recorte seguidamente com cuidado as palavras que formam o artigo e meta-as num saco.
Agite com cuidado.
Seguidamente, retire os recortes um por um .
Copie conscienciosamente segundo a ordem pela qual foram saindo do saco
o poema parecer-se-á consigo.
E voçê tornou-se um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade encantadora, ainda que incompreendida pelo vulgo.
Tristan Tzara
fotografia de Man Ray
De quantas facas se faz o amor
de quantas pedras se faz o vício
de quantos homens se faz o medo
de quantas noites se faz a morte
de quantas vidas se faz uma criança
de quantas ternuras se faz o tédio
de quantas horas
será feita a esperança que guardo
com sons de corpo arrastado
de quantas grutas será feita
esta humilde nas veias
que me acordam
de quantos poros será feito o mistério
de quantos gritos será feita uma religião
de quantos ossos será feita
a maldade
de quantos crimes será feita
esta lua que mal começou
e já me deixou no hábito de apurar
os sentidos
Fernando Lemos
DO VINHO E DO HAXIXE
CHARLES-Pierre BAUDELAIRE (1821/1867) é considerado um dos maiores poetas do século XIX. Herdeiro do romantismo e extremamente influenciado pela obra do escritor norte-americano Edgar Allan Poe, Baudelaire foi percursor do simbolismo e lançou as bases da poesia moderna (Rimbaud, Mallarmé, Verlaine, entre outros), revelando uma nova sensibilidade poética, baseada na experiência da vida urbana, e explorando temas como a melancolia, o tédio, a volúpia, a luxúria, o satanismo. Da sua bibliografia poética, destaca-se "As flores do Mal" (1857), obra que causou enorme escândalo, o livro despertou hostilidades na imprensa e foi julgado por muitos como um subproduto degenerado do romantismo, sobretudo pelo erotismo de alguns poemas. Além de condená-lo a uma multa por ultraje à moral e aos bons costumes, a justiça obrigou-o a retirar do volume seis poemas. Só a partir de 1911 apareceram edições completas da obra.
Tornou-se ainda conhecido como crítico de arte e literatura, e como tradutor dos contos de Edgar Allan Poe.
Baudelaire foi um dos primeiros escritores do século XIX a dissertar sobre sobre as drogas - a que desde muito cedo recorreu para estimular a inspiração- e os seus efeitos, tendo escrito diversos ensaios sobre o tema. Dos quais se destaca "Os Paraísos Artificiais" (1860), obra que reúne vários ensaios, e da qual faz parte este pequeno ensaio recentemente reeditado pelas edições Quasi.
"Do Vinho e Do Haxixe comparados como multiplicação da individualidade" tradução e notas de Helder Moura Pereira.
O VINHO
O DAIMON DO VINHO
Ó Homem querido deserdado
Cantava pela tarde o daimon do vinho nas garrafas
Da minha prisão de vidro e de lacre
Te envio uma cançao de luz e de fraternidade;
Não penses que ignoro quanto trabalho suor e sol a pique
Foi preciso reunir nas colinas em chama
Para fazer de mim um daimon actuante_
Estou-te grato. Não te farei mal.
É imensa a alegria que sinto
Quando deslizo pelas goelas do trabalhador cansado,
O seu peito quente é uma jazida muito mais do meu agrado
Do que as caves frias onde me conservo.
Não ouves as canções de domingo passado de boca em boca
E a esperança que chilreia no meu peito palpitante?
De cotovelos na mesa e de mangas arregaçadas
Teu júbilo crescente à minha glória canta.
Darei luz aos olhos da tua mulher rediviva
A teu filho, força e cores vitais _ serei para esse frágil atleta da vida
O óleo que endurece seus músculos de lutador.
Sou uma ambrósia vegetal, eu sei.
Uma semente preciosa lançada pelo Semeador
Em ti cairei para que do nosso enlace nasça a flor rara do poema_
Falarás, de igual para igual, com esse Criador.
Charles Baudelaire in. "As Flores do Mal"
Ó Homem querido deserdado
Cantava pela tarde o daimon do vinho nas garrafas
Da minha prisão de vidro e de lacre
Te envio uma cançao de luz e de fraternidade;
Não penses que ignoro quanto trabalho suor e sol a pique
Foi preciso reunir nas colinas em chama
Para fazer de mim um daimon actuante_
Estou-te grato. Não te farei mal.
É imensa a alegria que sinto
Quando deslizo pelas goelas do trabalhador cansado,
O seu peito quente é uma jazida muito mais do meu agrado
Do que as caves frias onde me conservo.
Não ouves as canções de domingo passado de boca em boca
E a esperança que chilreia no meu peito palpitante?
De cotovelos na mesa e de mangas arregaçadas
Teu júbilo crescente à minha glória canta.
Darei luz aos olhos da tua mulher rediviva
A teu filho, força e cores vitais _ serei para esse frágil atleta da vida
O óleo que endurece seus músculos de lutador.
Sou uma ambrósia vegetal, eu sei.
Uma semente preciosa lançada pelo Semeador
Em ti cairei para que do nosso enlace nasça a flor rara do poema_
Falarás, de igual para igual, com esse Criador.
Charles Baudelaire in. "As Flores do Mal"
ANGÚSTIA
Não venho , não, vencer esta noite o teu corpo
animal, pecador por todo um povo, nem
em tuas tranças cavar, impuras, tristes ondas
sob o tédio mortal derramado num beijo:
no teu leito o que busco é um sono sem sonhos
perpassando por sob cortinas de remorsos,
e que podes gozar em mentiras medonhas,
tu que sabes do nada ainda mais que os mortos:
porque o Vício, a roer minha nobreza inata,
marcou-me como tu com a esterilidade,
mas enquanto em pedra o teu seio é talhado
cheio de um coração que nenhum crime mancha,
eu fujo, angustiado, da mortalha que é minha,
com medo de morrer quando durmo sozinho.
Stéphane Mallarmé
ANOITECER
É como o sono que se aproxima, recolhendo
as suas asas,
ofuscante matéria do horizonte, algo assim,
pesado,
batendo na cara, na sua ardente solidão.
Em certas noites o vento canta.
No oásis cresce uma vegetação de pranto
e num porto sem luzes
aproximam-se as sombras da melancolia.
Um sino toca algures onde se enlouquece.
Procuro-te ainda, no interior da névoa,
no assombro das ilhas.
José Agostinho Baptista
imagem de Maggie Taylor
O BARCO ÉBRIO
Dita Parlo, fotograma de L'Atalante
" Pelo seu misto de esteticismo e realismo, pelo seu lirismo ancorado no quatidiano, pelo seu poder de subversão, Jean Vigo afirmou-se, ainda muito jovem, como um dos grandes poetas da sétima arte: o Rimbaud do ecrã. "
" Este equilíbrio de todos os elementos do drama visual no acolhimento terno de uma aceitação total (...) este quadro tão límpido, tão desprovido de emplastros e de pompa, clássico em suma, [constitui] o próprio espirito da obra de Jean Vigo, atormentado, febril, fervilhado de ideias e de fantasia conturbada, de um romantismo virulento ou mesmo demoníaco, ainda que constantemente humano. "
Élie Faure (texto editado em 1934)
Um realizador teimoso e doente: Jean Vigo. Um produtor inexperiente e opinativo: Jacques-Louis Nounez. Um inverno difícil: Dezembro de 1933. Dois actores célebres: Michel Simon, que tinha acabado de se impor com "Jean de la Lune"de Jean Choux (1931) e "Boudu Sauvé des Eaux" de Jean Renoir (1932), e Dita Parlo, vedeta berlinense. Um terceiro protagonista (Jean Dasté), amigo de Vigo e também herói da sua média-metragem proibida, (proibido até 1945 devido à sua mensagem anarquista), "Zéro de Conduite" 1933. Um argumento minimalista, pudico e violento ao mesmo tempo: a esposa de um marinheiro que o troca por um vendedor ambulante. Um director de fotografia inspirado: Boris Kaufman (operador de câmera de Dziga Vertov). Um músico de talento: Maurice Jaubert (entre muitos outros trabalhou com François Truffaut). E uma obra-prima mítica: L'Atalante. Começa então a maldição deste filme. 5 de Outubro de 1934: Jean Vigo, extremamente esgotado pela rodagem e sofrendo septicemia, morre. Tinha apenas vinte e nove anos e deste filme não viu senão uma primeira montagem...
Uma manhã o pacato e sedentário Isidro Vidal, reformado que leva uma vida tranquila, descobre que o processo comum de substituição de gerações foi alterado e acelerado. Hordas de jovens atléticos percorrem Buenos Aires à caça de idosos lentos e débeis.
Vidal e os seus amigos são obrigados a improvisar uma defesa desesperada. Têem de aprender a mover-se pela cidade a horas fantasmagóricas numa cidade apenas iluminada pelas tochas de uma guerra invisível, tão real como simbólica. Uma guerra contra grupos rivais mas também contra um inimigo comum: a inevitável passagem do tempo.
Um romance irónico que toca as situações mais comoventes da vida humana e um dos nossos maiores medos: o do tempo e da proximidade da morte.
Adolfo Bioy Casares "Diário da Guerra aos Porcos" cavalo de ferro
ADOLFO BIOY CASARES
Adolfo Bioy Casares (Buenos Aires, 1914/1999) é um dos escritores argentinos mais importantes do Século XX. Escreveu algumas obras em conjunto com Jorge Luis Borges sob o pseudónimo de H. Bustos Domecq, e com o qual fundou em 1935 a revista [ Destiempo ], foi galardoado com inúmeros prémios nacionais e internacionais, dos quais se podem destacar o Premio Municipal de Literatura de la Ciudad de Buenos Aires (1940), Premio Mondello (Itália, 1984), Premio Cervantes (1990), Premio Consagración Nacional (pelo conjunto da sua obra, 1992), para além dos inúmeros Doutoramentos honoris causa que foi recebendo um pouco por todo o mundo.
O CÃO
Exacto oboé de pelo
por quatro patas contido
humanos de não querer sê-lo
pontualmente enternecido
geométrica dose de amor
aos pés do dono rio
cão por fora absoluto
de cão não ser escondido
idioma de nascituro
povo no ovo, o seu latido
por nos seguir é cão.
Mas se seguido ?
Natália Correia
imagem de Greg Mably
23 de Julho 1920 - 06 de Outubro 1999
ESTRANHA FORMA DE VIDA
Foi por vontade de Deus
Que eu vivo nesta ansiedade
Que todos os ais são meus
Que é toda minha a saudade
Foi por vontade de Deus
Que estranha forma de vida
Tem este meu coração
Vive de vida perdida
Quem lhe daria o condão
Que estranha forma de vida
Coração independente
Coração que não comando
Vives perdido entre a gente
Teimosamente sangrando
Coração independente
Eu não te acompanho mais
Pára deixa de bater
Se não sabes onde vais
Porque teimas em correr
Eu não te acompanho mais
Amália Rodrigues in. “Versos” cotovia
ANTES QUE CHEGUE A NOITE
Antes que chegue a noite sobre o mar
e atire o vento da nortada
as minhas húmidas cinzas para o nada.
Antes que os gastos gestos se dissolvam,
tal como o sorriso que os transforma em esgar
ou os cansados espasmos de um amor extinto.
Antes, ainda, como este sol sobre as ilhas,
tenaz ponto de luz, cor intensa,
que as minhas palavras desenhem meu fantasma,
salvo e perdido, na pura intensidade da vida.
Juan Luis Panero
imagem de Nicoletta Ceccoli
Nouvelle Vague...
Christophe Honoré [ Dan Paris ] 2006
Aguardo ansiosamente a estreia do novo filme de Cristophe Honoré ( Ma Mère, 2004 ). O filme conta a história de dois irmãos, Guillaume ( Romain Duris ) e Jonathan ( Louis Garrel ), numa paris actual. Dans Paris é um filme sobre amores perdidos, e, ao mesmo tempo, sobre família e a capacidade de se encontrar novos amores. Uma produção barata e cheia de emoção que vai buscar em François Truffaut inspiração para um cinema francês moderno. Uma verdadeira homenagem à Nouvelle Vague.
PERFILADOS DE MEDO
Perfilados de medo, agradecemos
o medo que nos salva da loucura.
Decisão e coragem valem menos
e a vida sem viver é mais segura.
Aventureiros já sem aventura,
perfilados de medo combatemos
irónicos fantasmas à procura
do que não fomos, do que não seremos.
Perfilados de medo, sem mais voz,
o coração nos dentes oprimido,
os loucos, os fantasmas somos nós.
Rebanho pelo medo perseguido
já vivemos tão juntos e tão sós
que da vida perdemos o sentido...
Alexandre O'Neill
imagem de Gérard Dubois
Conversas com Pedro Almodóvar
Com os filmes de Pedro Almodóvar, a ironia e os paradoxos da vida atingiram o paraíso. Surgiu um mundo cuja profundidade muitas vezes reside na aparência; um mundo em que já nada tem sentido, a não ser o que parece ser contra-senso, e em que as perturbações vêm restituir a ordem. Nenhum amor paternal é mais belo do que o da mulher que foi homem; nenhum elogio da feminilidade autentica é mais belo do que o do homem que se tornou mulher. Todas as verdades que Pedro Almodóvar sabe revelar por detrás dos paradoxos do amor e do sexo, da comédia e do drama, foram coroados em TUDO SOBRE A MINHA MÃE. Soube tornar tais verdades muito populares, ainda que, paradoxalmente, fossem muito pouco esperadas e escutadas. É por isso necessário acreditar nele quando, colocado perante a casualidade de ter ao longo da carreira centenas ou milhares de entrevistas, declara não gostar de entrevistas. Também este paradoxo é eloquente: conversar sobre os seus filmes implica correr o risco de privilegiar a premeditação para evocar um gesto de criação passional, instintivo e, como ele próprio afirma aqui, visceral.
Frédéric Strauss
Frédéric Strauss "Conversas com Pedro Almodóvar" 90°
PERDIDOS # 1
PATTY DIPHUSA, estrela internacional da porno, nunca dorme. Por isso tem muitas histórias para contar, razão que a leva a aceitar o convite do director de uma revista pós-moderna para escrever as suas memórias.
Patty é uma rapariga cheia de vontade de viver, ingénua, terna e grotesca, invejosa e narcisista, amiga de toda a gente e sempre disposta a ver o lado melhor das coisas.
Descarrilada, amoral e engenhosa, Patty fala-nos das suas desvairadas incursões
pelas noites madrilenas, repletas de personagens de estranhos hábitos e vícios, e expressa, a seu modo, uma visão do mundo extremamente crítica, cruel, comovente.
OUTROS TEXTOS, reúne uma selecção de trabalhos escritos por Pedro Almodóvar entre 1979 e 1990. O conjunto compõe um retrato espantoso de um dos mais polémicos cineastas de hoje: as suas reflexões sobre a vida, o mundo do cinema, o percurso que acabou por convertê-lo num "estranho para si mesmo"
"patty diphusa e outros textos" difusão cultural 1992
tradução de Pedro Tamen
No prelo # 6
Reinaldo Arenas - O engenho - antígona
Miguel Esteves Cardoso - A minha andorinha - assírio & alvim
Gonçalo M. Tavares - O senhor Walser - caminho
Rui Nunes - Ouve-se sempre a distância numa voz - relógio d'água
Ana Teresa Pereira - A neve - relógio d'água
Margaret Atwood - A Odisseia de Penélope - teorema
NEM SEMPRE AOS POETAS APETECEM AS ESTRELAS
Apetece-me não sei porquê uma história de formigas
De formigas assexuadas negras nítidas e rápidas
Com olhos fantásticos colhendo miríades de imagens
E inúteis os olhos das formigas
Desenhadas como um oito ou como um sinal de infinito
Muitas corteses atarefadas prejudiciais
Clericais sociais subtílissimas pequenas
Formigando no chão
No chão onde florescem os cardos e as cores
No chão onde assenta a carne ansiosa das mulheres
E os joelhos dos homens
No chão onde ecoa a voz repugnante dos pregadores
E a voz das juras e dos negócios
No chão onde cai o suor dos aflitos
E o suor dos amorosos
E o suor dos operários
E o suor dos gordos
No chão onde andam os pés e estalam os escarros
No chão das guerras e das famílias correctas
E dos vasadouros e dos jardins
E do pus verde dos mendigos
E das chagas rendosas e das rendas custosas
E das doidas furiosas
E das rosas
E das airosas e das feias e dos bispos e dos triunfadores
E dos cretinos e das virgens
E dos remédios e dos males
E das vertigens e dos abismos
E das cismas
E dos sismos
E dos vermes do ventre e das sonecas
E dos ludíbrios e dos hábeis
E da força dos garantidos
E das sementes
Apetece-me não sei porquê uma história de formigas
A grande invasão das formigas multiplicando-se
Cobrindo a face da terra e a dos homens e das mulheres
Entrando-lhes pelos narizes para roerem os olhos por dentro
E fazendo bulir as coisas mortas e as vivas
Com o espantoso treme-luz irisado e magnífico
Dos seus reflexos negros e a substituírem todas as cores
Na grande montanha uma mulher enorme
Nua e infame
Tem as pernas escachadas sob as pregas do ventre
E sob as pregas do ventre seu sexo negro
É o grande formigueiro do mundo
Vive?
As formigas esvaziaram-na da enxúndia e substituíram-na
Só lhe deixaram a pele por fora para ainda haver branco visível
E como pêlos ampliados excitados e crescentes
Cobriram e desceram o vale
Enroscaram-se nas árvores
Desinquietaram a placidez das pedras
Forraram as aldeias e as cidades os animais e os homens
Que é do ciúme e das angústias?
Que é do amor e das palavras?
Que é das carícias e dos dentes?
Que é das renúncias e dos crimes?
Que é das tentações
Das promessas
Dos desejos
Dos apetites
Das fúrias?
Que é de todas as músicas?
O sol inútil cobre um mar negrejante onde os reflexos são como os olhos das moscas
E um silêncio tremendo finge de paz no mundo
Uma paz de silêncio com formigas
Formigas
Formigas
Formigas
Formigas
texto e imagem de António Pedro
ISABEL RUTH
ISABEL RUTH, bailarina, actriz, nasceu em Tomar, a 6 de Abril de 1940. Formada na Royal Ballet School de Londres, foi bailarina do Ballet de Lisboa e do Grupo Experimental de Ballet.
Estreou-se no cinema com um dos mais míticos filmes do cinema Português, "Os Verdes Anos", de Paulo Rocha (1963). Filmaria depois com os realizadores, António Macedo ( "Domingo à tarde" 1966 ), João Botelho ( "Conversa acabada" 1982 ), Manoel de Oliveira ( "O principio da incerteza" 2002 ), Fernando Lopes ( "O Delfim" 2002 ), José Álvaro Morais ("Peixe Lua" 2000), Teresa Villaverde ( "A Idade Maior" 1991, "Três Irmãos" 1994, "Os Mutantes" 1998 ) entre outros. Pier Paolo Pasolini convidou-a para participar no "Édipo Rei", em 1967.
No teatro, estreou-se na Casa da Comédia com "O Marinheiro", de Fernado Pessoa, encenado por Fernando Amado. Em 1994 compôs a musica para o filme, "A Caixa" de Manoel de Oliveira e em 1997 recebeu o Globo de ouro pelo filme "Ossos" de Pedro Costa.
Em 2006 chega a sua "Fotopoesia", um livro que reúne os seus poemas e algumas das suas fotografias. A invocação nostálgica de um tempo perfeito.
VERBO SER
Sou a 1ª pessoa
do meu verbo
a que vê
a que sente e reconhece
a que necessita do todo
para se ver
e nos outros
se vê a si somente
dou parte de fraca
tenho medo e recuo
o medo de existir
é tão feroz às vezes
que apelo a todo o meu sentir
o medo de ser
é tão atroz às vezes
que é preciso toda a voz
para se ouvir
tudo é tão veloz
breve passeio a sós
nesta centelha de existir.
Isabel Ruth in " Fotopoesia " Guerra & Paz
CANÇÃO DA MANHÃ
como os estranhos pássaros nascidos em tua boca
como os rios que te correm entre os olhos
como as esmeraldas que formam as asas dos teus ombros
como os longos ramos da árvore do sono do teu braço
como o grande espaço em que o teu corpo repousa
deitada na tua própria mão
como a tua sombra idêntica à nuvem
que se encontra com o mar
assim é a presença que de ti tenho
nas noites em que o fogo se acende
nas montanhas longínquas e fulgurantes
quando os meus passos me projectam
para os mais elevados cumes solitários
quando o sangue canta
através o aço vibrante do meu corpo
levando-me ao longo do caminho de flores rubras
que tu plantaste
assim é o desejo de te encontrar
nascida nas minhas mãos
erguida como torre duma catedral perdida
envolta na minha boca
caminhando comigo
pela estrada que nossos pés abrirão triunfantes
Mário Henrique Leiria
imagem de Colette Calascione
O AMOR
Somos casados, dormimos com raparigas sem qualquer escrúpulo. Imaginar, porém, a nossa mulher nos braços de outro e mataríamos a terra inteira. Não há nada a fazer, uma coisa não tem nada a ver com a outra coisa. Um homem nunca engana a sua mulher.
A MULHER E O AMOR
Detesto acima de tudo as mulheres que julgam que podem ser feias porque são inteligentes. Felizmente, nunca encontrei uma mulher inteligente.
AS MULHERES
Talvez as mulheres gostem dos impostores. Um homem, um verdadeiro, mete-lhes sempre um pouco de medo. Receiam ser magoadas. Um impotente é como uma boa amiga.
NO DIA-A-DIA
Por que é que temos vontade de mijar de cada vez que encontramos uma posição confortável para dormir ?
DEUS E OS SEUS SERVOS
Tornar-se Deus é no fundo tornar-se pouca coisa - é ficar nós próprios.
A CIÊNCIA
A fé eleva montanhas mas deixa-as alegremente recair sobre a cabeça daqueles que não a têm. De que serve erguer montanhas quando é tão simples passar por cima ?
QUESTÕES E PROBLEMAS
É inútil aprofundarmos um assunto tão pouco interessante; menos ainda do que qualquer outro; estava a pensar, em particular, na criação da caganita da mosca tirolesca e no tráfico da pulga da lã.
O TRABALHO
A guerra é a forma mais refinada e a mais degradante do trabalho uma vez que se trabalha para tornar necessárias novas obras.
AS PALAVRAS
Há momentos em que me pergunto se não estarei a brincar com as palavras. E se as palavras servissem para isso ?
SOBRE ELE PRÓPRIO
Julgo ter custado menos à França do que Napoleão; e no entanto, ele é muito mais conhecido do que eu.
" BORIS VIAN por BORIS VIAN " fenda
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