A BOCA DA VERDADE


O poeta LAWRENCE FERLINGHETTI, não cessa de pôr a poesia ao serviço da vivência andarilha, como numa permanente viagem pela vida sem fim, e suas paisagens mentais em multicolor. Tomando as palavras ao vivo e submetendo-as à mutação do instante, à autenticidade da emoção. Como um visionário percorrendo todos os cantos do teatro quotidiano, surpreendendo com lanterna mágica as várias faces do enigma poético, e usando para isso "a bela língua" ritmada de sons coloridos. Aventura onde as palavras são o veículo de situações específicas. Tocando o essencial de cada coisa de cada ser.
Atento a tudo, Lawrence Ferlinghetti, deixou de ser um poeta inspirado e passou a ser um inspirador.
O seu mundo é um longo percurso inconformista feito na estrada, no Jazz e na rua , Poeta da irreverência de São Francisco, implicado contra a guerra do Vietnam e todas as guerras (de Super Tiranus) censuras e polícias do espírito.
Poeta pacífico, exuberante e activo, permanece um percursor da nova poesia revolucionária, assim como Jack Kerouac, Allen Ginsberg, entre outros.
Ferlinghetti resiste à engrenagem da América decadente, mantém-se o Homem da estrada.
A poesia Beat é um meio de libertação total do espirito, voltada para o futuro, voltada para os que se procuram em oposição a tudo o que está acabado, fixo, estático, estabelecido.
Neste horizonte onde Lawrence Ferlinghetti continua vigilante, mostra-nos a cor da liberdade, o odor da revolta, a multiplicação de outros possíveis, onde o homem, a vida, a poesia, não são outra coisa senão uma invenção colectiva em perpétua mutação, em perpétua busca do sentido convulsivo.
Lawrence Ferlinghetti é a prolongação de Rimbaud, Artaud e todos os que souberam arriscar-se para arrancar a máscara à REALIDADE.

" SOU UMA LÁGRIMA DO SOL, SOU O HOMEM DOS POEMAS DESPENTEADOS, SOU UMA COLINA DE POESIA "

Lawrence Ferlinghetti

2 comentários:

lebredoarrozal disse...

ferlinghetti é deus!!!!

Anónimo disse...

ARTES, LITERATURA E A CIVILIZAÇÃO: ELAS QUE SE DANEM! (*)


Poderia a arte e a literatura atuar positivamente na solução de questões nacionais? Poderia, mas por enquanto não. O entrave desse emboto é a predominância, na imprensa diária, de um embate político partidário que ela não consegue se livrar e que já encheu os picuás.



Em entrevista recente ao ex-deputado e ex-ministro, José Dirceu, um ex-líder estudantil e ex-parlamentar do PT, Vladimir Palmeira, surpreendeu a todos dizendo que, se vencedor, o Movimento Estudantil de 68 desembocaria numa extraordinária produção artístico-cultural. Se verdadeira a afirmativa, (acho que sim) esta seria mais uma prova da importância que a cultura tem na vida de cada cidadão. Surpreendente, também, que nos dias de hoje, com a liberdade de expressão que desfrutamos, não experimentemos essa explosão criativa.



Para inverter esta tendência, ou seja, a polarização citada acima para o retorno das artes e da literatura, na vida dos brasileiros, antes de tudo será preciso um esforço dos profissionais dos três setores (arte, literatura e imprensa), na busca de pautas ligadas à contemporaneidade. A vida do brasileiro não se resume ao parlamento e a sua relação com as redações dos maiores veículos de comunicação. O país pulsa e se desenvolve, através de um outro segmento, econômico, histórico e cultural, o que, seguramente, não está refletido nas páginas dos jornais, tão pouco nos palcos brasileiros. A literatura, talvez, seja a exceção, no entanto padece de um entrave gigantesco. A indústria editorial está atrelada a determinados pontos de distribuição e venda dessa produção O volume de títulos, anual, é muito grande, em relação ao mercado consumidor existente. Ele precisa se expandir, porém encontra aí seu maior obstáculo, a imprensa especializada que restringe esta venda a um universo muito estreito da população, aquela que tem renda familiar acima de 10 salários mínimos.



Um outro fator que contribui significativamente para emperrar uma pauta que discuta o nosso desenvolvimento e, principalmente, nosso subdesenvolvimento, é a omissão da realidade projetada nos dias atuais. Falo das décadas de 80 e 90. Este período não é levado em consideração. Curiosamente, quando se evoca a memória, busca-se o passado anterior à movimentação desse período. A própria expressão "década perdida", é uma forma de escamotear a realidade. Como perdida, se houve história, política e cultura? Reputo isso, a mesmice da qual padecemos.



Na virada da década de 70 para 80, surgiu um tipo de literatura que acabou contagiando as demais formas de expressão - a literatura confessional. No que consiste esta literatura? Consiste no relato da história pessoal, como reflexo do período em que viveu o personagem principal e o autor da obra. O caso mais expressivo, em número, é o do jornalista e militante, Fernando Gabeira (O que é isso companheiro) e, de importância, o hoje escritor consagrado, Marcelo Rubens Paiva (Feliz ano Velho). Por que se vendeu tanto livro, no período? Porque havia uma demanda reprimida, na maioria da população jovem, potencialmente apta a ler esses relatos. Era uma curiosidade muito grande saber como viviam os personagens clandestinos, ou fechados em suas pequenas tribos. A Censura criou essa expectativa, ao longo dos anos de chumbo. Portanto, esta literatura que influenciou o teatro (no caso de Paiva) e cinema (no caso de Gabeira), desenvolveu um mercado, mas não criou vínculos com a literatura mais elaborada. No vazio, as editoras foram obrigadas a dar toda força para a literatura de auto-ajuda. A situação não é tão simples assim, automática, mas apresenta algumas evidencias da falta de espaço para aqueles que se detiveram a desenvolver uma escrita contemporânea. Um dos exemplos se manifesta na demora das filmagens do livro de Gabeira - praticamente 15 anos depois. Esta demora transformou a película, num quase pastiche, o que motivou muitos e justos protestos. Em muitos festivais, o filme foi classificado como de ação, e não um filme político. Prova, ao meu ver, que a informação histórica trazida pelo autor do livro, por essa época, já tinha sido absorvida pela realidade e pelos debates que se seguiram, aí sim, pela imprensa.



Vejo, hoje, o "esquecimento" da década de 80, até o filme "Entreatos", de João Moreira Salles, que justamente documenta a chegada de Lula à presidência da República, como o fator principal do boicote a uma arte e literatura mais atuante, mais ousada. O grande trunfo das artes e da literatura é fazer pensar, o que pode ser mortal para o status quo. É preciso dar voz e vez àqueles que ousam sonhar o futuro, como fizeram, no passado, os grandes artistas da década de 60 e 70. No teatro e na literatura, é preciso resgatar a fábula, como faziam as montagens do Grupo Oficina, o movimento Tropicalista e a Bossa Nova. Inventar uma nova forma de expressão é inventar um mundo melhor. A minha referência é a prosopopéia Panamérica, de José Agripino de Paula, falecido no ano passado. Para muitos, é a poesia concretista dos irmãos Campos, enquanto para outros, o poeta Paulo Leminski ou a escritora Clarice Lispector. Todos nos levam ao Paraíso.



Ao ter meu início de noite, invadido por personagens, via tevê, que não teriam sequer espaço nos livros de Adelaide Carraro, nem mesmo no seu livro campeão de vendas - Eu e o Governador, me pergunto, que país é esse??? Quase sempre, me lembro de Renato Russo, Cazuza e Cássia Eller, artistas que se foram, sem ter o merecido reconhecimento. Reconhecimento, para mim, é imaginar o Maracanã ou Morumbi cheios, gritando pelos poros - Oh, Oh, Oh, Renato é nosso Rei. Uh, Uh, Uh, a Cássia é a nossa vez. Cazuza, idem!



Jair Alves - Dramaturgo - São Paulo/SP



(*) Título inspirado na composição de Gilberto Gil, "Cultura e Civilização".

A cultura e a civilização, elas que se danem, ou não!