RECEITA SURREALISTA
Mande vir com que escrever, depois de se ter instalado num lugar tão próprio quanto possível à concentração do seu espírito sobre si-mesmo. Coloque-se no estado mais passivo, ou receptivo, que poder. Abstraia do seu génio, do seu talento e de todos os outros. Repita a si-próprio que a literatura é um dos mais tristes caminhos que levam a tudo. Escreva depressa sem assunto prévio, suficientemente depressa para não parar e não ser tentado a rever. A primeira frase virá sozinha, de tal modo é verdade que em cada segundo existe uma frase estranha no nosso pensamento que só deseja exteriorizar-se. É bastante difícil pronunciarmo-nos sobre o caso da frase seguinte; ela participa simultaneamente da nossa actividade inconsciente e da outra, se admitirmos que o facto de termos escrito a primeira arrasta um mínimo de percepção. Aliás, isso pouco lhe deve importar; é nisso que reside, na maior parte dos casos o interesse do jogo surrealista.
A verdade é que a pontuação se opõe, sem dúvida à continuidade absoluta da corrente de que estamos a falar, embora pareça tão necessária como a distribuição dos nós numa corda vibrante. Continue enquanto lhe apetecer. Fie-se no carácter inesgotável do murmúrio (...).
André Breton
fotografia de Man Ray
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2 comentários:
Caro Miguel...
Não lhe conhecia este interessante gosto pela "gastronomia"...literária...ou lá o que for.
Muito bom.
Esta coisa das receitas sempre me fascinou...sobretudo...porque para além do clássico ovo estrelado com molho de alcaparas...pouco mais não sei...
Cumprimentos
Caro cosal, é verdade... o sr do café também sabe umas receitas, hoje em dia não se pode viver só das bicas, temos que apostar também no prato do dia...
;)
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