RIR- [SE] NO CINEMA


Buster Keaton, como se sabe, nunca se ri nos seus filmes. No meio das situações mais hilariantes, seja agressor, vítima ou tão-só espectador, não se desfaz do seu rosto imperturbável, atravessando os gangs com uma placidez desarmante. Esta sistemática neutralidade de expressão remete para a mecânica que rege o seu cómico. É uma componente intrínseca e que sem dúvida ganha a melhor a mais que um riso hesitante. Pois, em circunstâncias semelhantes uma tal retenção da mímica é dificilmente aguentável: o espectador, perante ela, vê-se por assim dizer, obrigado a rir-se. É que aqui o riso aparece, entre outras coisas, como meio óptimo de apropriação da monstruosidade mecânica de Keaton (meio tanto mais óptimo quanto essa monstruosidade visa totalmente o efeito cómico), vindo humanizar-lhe a parcimónia (poupança) fisionómica. O riso parece portanto ausente do écran para melhor existir na sala. (No extremo oposto está o riso interminável e sádico do anão com que fecha "les nains aussi ont commencé petist"*, no riso devorador que gela o espectador).

*[ Auch Zwerge haben klein angefangen ] Werner Herzog, 1970

aka "Even dwarfs started small"

Daniel Percheron, in "psicanálise e cinema" relógio d'água, 1984

3 comentários:

anabela moutinho disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
anabela moutinho disse...

(sabia que ele estava impedido, contratualmente, de rir em público em qualquer evento ligado ao mundo de hollywood?)

miguel. disse...

não fazia a mínima ideia... mas agora percebo o porquê da sua permanente seriedade...