desconheço o país que uma casa inaugura
a sebe que rodeia o jardim de um crepúsculo,
o meu corpo é uma viagem onde não há cidades
nem rios, nem desertos, nem florestas, nem encontros,
o meu corpo, consumiu-o um rosto
que se colou a mim como o seu abandono

nunca voltes ao caminho que ficou para trás:
uma casa espera-te com a sua maldição,
os seus ruídos que minam na penumbra,
o conforto de reconheceres como pensavas a morte;
não te esqueças de que a morte é o primeiro olhar de um rosto,
não te detenhas no terraço sob as buganvílias,
nem junto ao muro onde o corpo de um homem foi riscado a giz:
o desenho espera-te com a sua paciência:
braços abertos, pernas unidas e a sombra
de uma criança que se afasta,
não te iludas, porém, a criança é somente
o jogo de uma infância que não foi a tua


Rui Nunes, in "Ofício de Vésperas" relógio d'água, 2007

3 comentários:

Catarina Barros disse...

Este rui nunes persegue-me, miguel. É... brutal.

Night Shadow disse...

belíssima escolha de poeta e de poema. e belíssima fotografia.

miguel. disse...

Rui Nunes entranha-se... é um autor que gosto de ir lendo... a sua leitura requer um certo estado de espirito... já tinha reparado que a catarina também gosta dele...

obrigado night shadow... quanto à fotografia não sei de quem é, normalmente gosto de identificar os autores... enfim.