Poetas esquecidos 1#



SOU UMA CRIATURA

Como esta pedra
de São Miguel
assim fria
assim dura
assim enxuta
assim refractária
assim totalmente
desanimada

Como esta pedra
é o meu pranto
que não se vê

A morte
desconta-se
vivendo


Giuseppe Ungaretti, in "Sentimento do tempo" dom quixote, 1971
trad. Orlando de Carvalho




AGONIA

Morrer como as sedentas cotovias
na miragem

Ou como a codorniz
uma vez atravessado o mar
nos primeiros arbustos
porque de voar
já não tem desejos

Mas não viver de lamentos
como um pintassilgo cego


Giuseppe Ungaretti, in "Vida de um Homem" hiena, 1987
trad. Luís Pignatelli



Giuseppe Ungaretti, de família toscana, nasceu na cidade de Alexandria (Egipto) no ano de 1888. Fez parte dos seus estudos em Paris (Sorbonne) licenciando-se em Letras. Toma contacto com os movimentos de vanguarda da altura, futurismo, surrealismo e hermetismo, o qual foi considerado um dos principais defensores. Torna-se amigo de Apollinaire e André Gide, pertenceu aos grupos literários «Lacerba» (fundado por Papini em 1913) e «La Ronda» (fundado por Vincenzo Cardarelli em 1919). Em Itália trabalhou como jornalista, combateu durante a primeira guerra mundial, nos Alpes. Em 1932 para fugir ao fascismo parte para a América Latina onde irá dar aulas de Literatura Italiana na universidade de São Paulo, Brasil. Em 1945 após a morte de Mussolini regressa a Itália onde irá leccionar até 1958 na Faculdade de Letras de Roma. Morreu a 3 de Junho de 1970, sem receber o Prémio Nobel, ao qual era candidato pela segunda vez.

5 comentários:

Anónimo disse...

ungaretti e as pedras
à terde eterna de um escarlate idem
ungaretti e as palavras entre alexandria e roma
pássaros por sobre os telhados
asas desarmodaçadas...livres dos
irracionais fuzis
e das estratégicas
flores carnívoras

Anónimo disse...

ungaretti e as pedras
à tarde eternal
de um escarlate idem
ungaretti e as palavras
entre alexandria
e roma
asas desarmodaçadas
por sobre
os telhados
livres dos fuzis
estratégicas
flores carnívoras

Anónimo disse...

ungaretti e as pedras
à tarde eternal
de um escarlate idem
ungaretti e as palvras
por sobre os telhados
entre alexandria
e roma
vôos desamordaçados
livres dos fuzis
e suas
estratégias carnívoras

Unknown disse...

Os Mares do meu destino


Desespero por uma luz.
Uma luz ténue e bela que me guie para o porto da minha quietude.
Desejo a tranquilidade e não o reboliço de gentes que chegam e partem sem deixar saudade.
Abomino o vazio das multidões e o frenesim dos ratos de experieencias mil que correm e recorrem nos seus labirintos.
Dão-me repulsa as obrigações e convenções.Os tratados e acordos ,as penalizções e julgamentos.
Desejo que a noite que pausa a recorrente correria não cesse e que por milagre ou por destino permaneça embalado nos sonhos até que a mente purgue esta bilis amarga que me corroi a paz e a alegria.
Desejo acordar desta ilusão pesada e castigadora que perverte e tenta esculpir cada ser á imagem da sua deformação.Como um ser feio e cruel que por força elimina a beleza para que a sua fealdade passe desapercebida.
Quero voltar a ouvir a voz conselheira do mar . Inspirar e reter a sua infinita sabedoria.
Quero aconselhar-me com o vento e perceber as suas mudanças de humor.Sentir o sol a beijar-me o rosto sem me queimar.
No fundo rodear-me de tudo o que é verdadeiro e por isso eterno.
Persigo incessantemente a simplicidade por entre a névoa das mentiras do cenário que me rodeia.Todos os dias rasgo o guião que me tentam fazer seguir silaba a silaba e improviso revoltado duas ou tres palavras em cada frase para que me sinta vivo.
Nesta revolta sobrevive a esperança dos que acreditam sempre até ao fim.
Nesta esperança é gerado todos os dias o homem novo.
Volteando e retorcendo ,caminhando, perdendo e ganhando todos os dias algo permanece intocável.
Aquela chispa de fogo que não se apaga.
Chamem-lhe esperança ou loucura.Ela por pequena e refundida é sustento,é base ,é a ancora que me segura á vida.
Não se extingue nem é passageira e por isso a sei verdadeira.
Com este fogacho me uno ao meu próximo fazendo um grande circulo de fogo que na altura em que a névoa se desvaneça irá iluminar e aquecer quem tenha frio e sede e vontade de voltar a ver.
Se a grande mentira me vencer espero ser humilde e caminhar ao lado de todos os cegos e famintos até á fonte.
Saciar a minha sede e pedir perdão pela fraqueza de ter sucumbido á ilusão.
Que o véu se levante e todas as coisas postas a descoberto.
Que todos os segredos deixem de o ser e caminhando nu a harmonia de pertencer ao todo me embale nos seus braços e não mais se afaste.
Que a leveza me transporte no grande voo das aguias e o vento me acaricie o rosto num beijo terno e eterno.
Sei que um dia vou voar .
Sei que a liberdade me aguarda em cada pensamento,em cada palavra,em cada escolha em cada esquina.
Não fora a maldita névoa e já hoje voaria por entre os cumes do meu sentir e sobre os mares do meu destino

Unknown disse...

Precisamente o que procuro,sentido para a existência humana