EXPLICAÇÃO PSICANALÍTICA DE «JESUS (FAMÍLIA E COMPLEXOS, FAMÍLIA DE COMPLEXOS. COMPLEXO DE FAMÍLIA)» :

«Jesus, o femeozito masoquista, que depois de se ter deixado esbofetear numa face estende a outra, não era desses a quem satisfaz um simples retornozinho ao seio materno.
Era-lhe necessário subir ao mais íntimo do aparelho genital do genitor, dele se tornar uma parte, digamos o testículo direito, visto que a trindade pode, deve interpretar-se como o conjunto tripartido, quanto à aparência, de um sexo macho, uma banana e duas tangerinas, diremos nós, o estilo oriental só permitindo comparações fruteiras. [...]
Antes da apoteose masoquista, houve, evidentemente, alguns divertimentos, o que os franceses chamam ninharias de ao pé da porta: namoro baptismal com São João Baptista, loçõezinhas íntimas e perfurmadas pelas mãos das Santas mulheres e, sobretudo, a Ceia com o pão (e pão comprido, sabe-se o que ele pode representar e sabe-se também que nunca os pintores deste repasto — que de quadros célebres! — pousaram na mesa pequenos pães rachados, simbólicos, esses sim, do sexo femenino). [...]
Centuriões, belíssimos rapazinhos, com as barrigas das pernas cingidas por grevas de ouro, pareciam mais superiormente nus logo que o joelho sobressaía. [...]
Com uma elegantíssima túnica branca, curvado sobre a cruz, Jesus expunha o dorso. No momento em que Pôncio Pilatos lavara as mãos, o simbolismo sexual tornara-se evidente. Jesus caía, levantava-se, quer dizer, tinha gozado, reencontrava-se pronto a gozar, voltara a gozar sob o chicote dos atletas sugestivamente vestidos.
Ora, da mesma forma que a jovem esposa grita "mamã" no pavor da volúpia, ele não parava de chamar pelo pai. [...] Mas então veio a esponja de vinagre, isto é, o desprezo do mais belo dos soldados por este farrapo que queria ser a sua rameira. Este legionário que, no meio das putas amontoadas ao pé da cruz, não podia deixar de reconhecer o traseiro experiente de Maria Madalena, não dará a Jesus a honra da mínima secreção prostática. Contenta-se em mijar-lhe na boca.
Então, completa-se o trio. Entre os dois ladrões, as duas castanhas (as suculentas laranjas divinas encarquilharam, secaram até não passarem de pobres castanhas), o Cristo não é mais do que a sombra de um miserável rolo de cabelo.»

René Crevel


in, Jules-François Dupuis [aka Raoul Vaneigem] "história desenvolta do surrealismo" antígona (1979)

Sem comentários: