Não deixeis um grande amor
Aos poucos apercebi-me do modo
desolado incerto quase eventual
com que morava em minha casa
assim ele habitou cidades
desprovidas
ou os portos levantinos a que
se ligava apenas por saber
que nada ali o esperava
assim se reteve nos campos
dos ciganos sem nunca conseguir
ser um deles:
nas suas rixas insanas
nas danças de navalhas
na arte de domar a dor
chegou a ser o melhor
mas era ainda a criança perdida
que protesta inocência
dentro do escuro
não será por muito tempo
assim eu pensava
e pelas falésias já a solidão
dele vinha
não será por muito tempo
assim eu pensava
mas ele sorria e uma a uma
as evidências negava
por isso vos digo
não deixeis o vosso grande amor
refém dos mal-entendidos
do mundo.
José Tolentino Mendonça in. "longe não sabia"
imagem de lorenzo mattotti
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2 comentários:
os lúcidos escrevem assim!
"não deixeis um grande amor"
é, um grande amor vai connosco pela vida fora dentro de uma caixa pequenina com furinhos para poder respirar, e ninguém se importa se seremos felizes assim.
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