Há-de flutuar uma cidade no crepúsculo da vida
pensava eu...como seriam felizes as mulheres
à beira-mar debruçadas para a luz caiada
remendando o pano das velas espiando o mar
e a longitude do mar embarcado

por vezes
uma gaivota pousava nas águas
outras era o sol que cegava
e um dardo de sangue alastrava pelo linho da noite
os dias lentissímos... sem ninguém

e nunca me disseram o nome daquele oceano
esperei sentada à porta... dantes escrevia cartas
punha-me a olhar a risca de mar ao fundo da rua
assim envelheci... acreditando que algum homem ao passar
se espantasse com a minha solidão

(anos mais tarde, recordo agora, cresceu-me uma pérola no coração.
mas estou só, muito só, não tenho a quem a deixar.)

um dia houve
que nunca mais avistei cidades crepusculares
e os barcos deixaram de fazer escala à minha porta
inclino-me de novo para o pano deste século
recomeço a bordar ou a dormir
tanto faz
sempre tive dúvidas de que alguma vez me visite a felicidade.

Al Berto in. "Vigílias" assírio & alvim
imagem: Luís Noronha da Costa

4 comentários:

ana marta disse...

é sem dúvida um dos meus poemas preferidos.

miguel. disse...

se não estou em erro, a primeira vez que deixei um post no seu blog(www.o-sabor-da-cereja.blogspot.com), foi num poema que continha um excerto deste poema. Sim é muito bonito, tb gosto muito, e talvez tenha sido por isso que desde então me tornei um curioso nas suas palavras... ;)

ana marta disse...

pode tratar-me por tu! :)

miguel. disse...

claro... tu também :)