VISITAÇÃO:

Não. Grita. Com medo de um regresso. Sabe que as palavras matam. Mas. De vez em quando. Uma. Outra. Têm um destino. Qual. A crueldade de uma frase. Uma história. Vulgar. A pocilga. A pocilga cheia. A pocilga cheia de porcos. Sujos. De esterco. Os focinhos contra a rede de arame. Esmagados. Os seus olhos com a desmesura de frinchas. No róseo de uma carne já podre. Grunhiam. Vida boçal. Sempre famintos. Por vezes, ratavam os pés das crianças que as mães esqueciam no cortelho. Enquanto. Enquanto atiçavam o lume. Afogueadas. Cala-te, estafermo: berravam de longe. E os porcos roíam. Roíam. Até ao silêncio. Adormeceu: pensavam as mães. As crianças, porém, estavam mortas. E rodeadas de bichos.
Sôfregos.
Sôfrego.
És um animal sôfrego.

Rui Nunes, in "A mão do oleiro" relógio d'água, 2011

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