A inquietante procura de grandes escritores faz com que a maioria dos recém chegados tenham ar de sair duma estufa: dominam-se, trabalham-se, martirizam-se, aperfeiçoam-se, querem estar à altura do que deles se espera, à altura da sua época. O crítico, esse, não desiste : descobrirá custe o que custar, é a sua missão. Esta não é uma época como as outras. Todas as semanas lhe é preciso um novo objecto para lançar na arena ao som de fanfarras: um filósofo tahitiano, um grafito, Rimbaud redivivus; dir-se-ia por vezes, no meio da fiesta ritual e colorida que se tornou a nossa «vida literária», uma corneta enlouquecida que tocasse para tudo ao mesmo tempo com medo de se esquecer de alguma coisa: a saída do toro e a do cavalo do picador. A "saída" dum novo escritor oferece-nos frequentemente o espectáculo penoso duma pileca esgalgada tentando lugubremente levantar a garupa no meio dum estralejar teatral de chicotes de circo – nada a fazer; uma volta à pista e basta, fareja o estábulo imediatamente e logo corre para a mangedoura; já não presta senão para arengar ou repetir-se, ou para meter num júri literário, onde por sua vez incubará qualquer novo potro de pernas e dentes longos.

Julien Gracq, in "A literatura no estômago" assírio & alvim, 1987
trad. Ernesto Sampaio

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