NOVAS IMPRESSÕES DE ÁFRICA

((((((Tais como: — a sombra, ao meio-dia, no mostrador solar,
Mostrando que o estômago reclama o seu manjar;
— Pois pelo gelo, negue-o ou não, o metro padrão;
— Desafiando a lama, da dobra de um calção;
— Uma folha de jornal no buraco da retrete;
— A bota esburacada cujo salto se derrete;
— O que, atento, um rabino desgrenha com a unha;
— A pilha de talheres que o lacaio na mesa punha;
— Pelo barbeiro rodadas, as quentes costas da cadeira;
— O metro que, ao despertar, um veterano hasteia;
— Julieta, na gala de Ejur, e Romeu
Por dois mimos crianças, feitos grátis pro Deo;
— O ferro que, em cena, um bravo quebra à mão;
— Um sacristão, salivando, indo à missa pelo pão;
— O espargo posto de lado, uma vez dada a dentada;
— Mortalmente ferido o verme, ao cair da enxada;
— Bengala a meio ferrão, quando há um falso alerta;
— A estante elevadíssima à musica fresca aberta;
— Quando um menino ao piano anda à roda no assento;
— O velho bloco-notas, outrora corpulento;
— A pausa que se faz depois da sopa comida;
— A mortalha do cigarro colocada sobre a ferida;
— O bafo deixando nódoa no espelho que entristece;
— Ao primeiro relâmpago, a vela de rizes estremece;
— Após lauto banquete, a mesa rearredondada;
— A arca onde, agressiva, sobe a água a ser estudada;
— Para o torvo hálito do fumador, a acendalha;
— O rabo aparado em sangue que ao totózinho calha;
— Quando a amestragem age, ocioso é o cinto;
— Se calha cair-lhe a cabeça, o amorfo extinto;
— O tubo aberto e chato que um aprendiz enrola;
— Se o botão cai de maduro o elástico encaracola;
— Quando a cama ganha ao berço, ao espaço algo acontece;
— O taráxaco que, por querer, bafo cruel fenece;
— Executadas as pontas, a bailarina esplendente;
— O acto interpretado pelo Dr. X, de um delinquente;
— Quando a mangueira cede à sede, o jacto em lança;
— O fio que pela aranha escalado se balança;
— Sobre um tapete verde, um homem primata;
— Um charuto reduzido a uma simples beata;
— O disco do sol em pleno céu de Neptuno;))))))

Raymond Roussel

in, André Breton "Antologia do Humor Negro" edições afrodite, 1973
trad. Luisa Neto Jorge

2 comentários:

Anónimo disse...

tenho o NOVAS IMPRESSÕES DE ÁFRICA :)

miguel. disse...

Manuel, um livro cada vez mais difícil de encontrar... só tenho este texto na Antologia do Breton e ainda tenho mais uns do Impressões de África num livrito sobre o surrealismo...

:)

p.s. a promessa não está ainda cumprida... mas também não está esquecida....

abraço