Francesco de Zurbarán [ natureza morta ] 1640


FUMO AO ENTARDECER

Depois de ter cheirado o perfume agridoce da morte,
depois de tantos corpos e paixões e sonhos,
olho agora, sobre a mesa, um copo vazio,
uns livros, papéis em desordem, velhas fotografias,
a luz ao entardecer, apagando-se na janela.
Como uma natureza morta de Zurbarán
— a natureza morta, a natureza eterna —,
deixo-me viver já sem perguntas,
enquanto o fumo do cigarro desenha
todos os meus rostos: o que fui, o que sou,
o que serei, no frágil e caprichoso tempo.

Juan Luís Panero, in "poemas" relógio d'água (2003)

Sem comentários: